Luiz Augusto L. da Silva*
Há alguns anos, em uma das Universidades em que atuamos, havia um banner gigante pendurado na parede de um prédio. Dizia mais ou menos assim: “Dentro de um ano, haverá mais 400 mil veículos nas ruas. Para superar desafios como este, nossos institutos tecnológicos desenvolvem soluções empresariais competitivas e inovadoras blá-blá-blá…”.
Vejam só: mais 400 mil veículos nas ruas, já entupidas deles! São notórias a prepotência e a arrogância do sistema. Para qualquer mente racional, na conjuntura atual, 400 mil veículos a mais seriam um problema terrível, insolúvel! Mas, para os adeptos do jogo insano da economia, tratava-se de suplantar “mais um desafio”.
É óbvio que a única solução lógica e inteligente seria não fabricar mais 400 mil veículos! Na verdade, não produzir nem mais 50 mil, ou 10 mil, ou qualquer que fosse o número, salvo, talvez, raros casos pontuais de necessidades extremas e comprovadas.
O problema é que, se não botássemos mais 400 mil veículos nas ruas, o sistema vigente quebraria. Sobreviriam demissões, famílias passando fome, e todo o tipo imaginável de carências, num dominó social trágico. Tudo porque o Homo sapiens não sabe viver sem dinheiro. E o novo coronavírus está aí, diante de todos, para mostrar isso mais uma vez, conclamando-nos a refletir.
Ao longo de milênios, instigados pela ganância e agressividade favorecidas geneticamente pela seleção natural desvendada por Darwin, construímos um modelo de civilização onde, para haver progresso, deverá haver vencedores e derrotados, em maior ou menor escala.
Dentre todas as religiões que inventamos, a pior de todas (e, infelizmente, a única levada a sério) é a religião do dinheiro. Seu fanatismo vai nos destruir. Precisaríamos, urgentemente, banir o dinheiro do mundo, em nome da nossa sobrevivência e do planeta, criando um novo modelo civilizatório, baseado de verdade no conhecimento, na justiça e na igualdade. Já chega de ouro, diamantes, moedas, luxos e bolsas de valores, os grandes cassinos do jogo trágico da economia! Podem rir, e debochar, não me importo.
Ingenuidade? Utopia? Em tese, poderia parecer simples. Na prática, impossível, dada a situação mundial hoje. De qualquer forma não seria imediato. Demandaria doses astronômicas de educação de alto nível. Mas não há mais tempo. Desconfio que passamos do ponto crítico. Já estamos entalados até o pescoço no gargalo. Entretanto, pelo sim e pelo não, convém recordar o dito popular: a esperança é a última que morre…
Fermi
Pensando bem, o tal paradoxo de Fermi não é paradoxal coisa nenhuma. Deveríamos nos referir a ele como a “constatação de Fermi”. O paradoxo resultaria da suposta abundância de vida e civilizações tecnológicas no Universo, e sua inexplicável ausência na Terra hoje, em vista da antiguidade do cosmos. Mas, se civilizações são, realmente, becos sem saída evolutivos e, ademais, sua taxa média de formação por galáxia é demasiado baixa (veja, por exemplo, as Oficinas de Astronomia® 431 e 442, disponíveis em nosso canal no Youtube), então as galáxias nunca seriam povoadas. Estaríamos sempre sozinhos, sem vizinhos para conversar. Tudo normal. Sem paradoxo!
A única maneira de confirmar, refutar, ou, pelo menos, conhecer um pouco mais sobre a validade ou não deste cenário singularista seria incentivar a continuidade dos projetos SETI, aumentando sua abrangência e completicidade, em termos da quantidade de estrelas pesquisadas, grau de sensibilidade, cobertura temporal e varredura espectral de frequências.
Enquanto isso, o coronavírus continua a nos desafiar, por mal ou bem, convidando-nos a mudar nosso comportamento, substituindo-o por uma opção de postura mais sábia, que faça jus ao nome científico que atribuímos a nossa espécie. Estima-se que existam cerca de meio milhão de espécies de vírus no mundo, todas com potencial de causar pandemias iguais ou muito piores que a enfrentada hoje. E a propósito: existe vacina contra impacto de asteróide?
————————-
* Astrônomo, presidente do Conselho Curador da Rede Omega Centauri para o Aprimoramento da Educação Científica.