Luiz Augusto L. da Silva*
Até que ponto seria possível o cenário clássico de ficção científica onde alienígenas beligerantes invadem a Terra tentando conquistá-la? Referimo-nos, por exemplo, a situações como as relatadas no romance (depois duas vezes filme) A Guerra dos Mundos, do escritor inglês H. G. Wells (1866 – 1946), e seus filhotes cinematográficos Independence Day 1 e 2, só para citar alguns casos.
Esta questão astrosociológica pode ser trabalhada a partir de algumas premissas razoáveis. Aparentemente, nossa galáxia, a Via Lactea, não foi ainda largamente colonizada, apesar de ter mais de dez bilhões de anos de idade. Na Oficina de Astronomia® 442, disponível em nosso canal do Youtube, mostramos que isto é surpreendente, e parece implicar a inexistência de outras civilizações além da nossa, em nossa galáxia doméstica.
De fato, como os leitores destas linhas poderão ver, assistindo à referida Oficina, evidências circunstanciais sugerem que a taxa de aparecimento de civilizações na Galáxia seja muito baixa (da ordem de, quiçá, uma civilização por giga-ano), e que provavelmente duas ou mais civilizações não coexistem nela.
Se este cenário estiver correto, então a probabilidade de, algum dia, resultarmos invadidos por uma civilização extraterrestre hostil é nula, pelo simples motivo de que não haveria invasores em potencial!
Porém, mesmo em um cenário pluralista fraco, ou seja, de existência simultânea de algumas poucas civilizações na Galáxia, a probabilidade de experimentarmos um contato com uma raça alienígena agressiva poderia, também, ser pequena, para não dizer zero, porque, na mesma Oficina referida acima, especulamos que, no Universo, poderia haver cinco categorias básicas de sociedades inteligentes tecnológicas, quanto ao grau de desenvolvimento: civilizações primitivas, civilizações adolescentes, civilizações maduras e, talvez, civilizações sêniores. Lá vimos também que a transição da adolescência para a maturidade social provavelmente se daria, na maioria das vezes, pela travessia de um gargalo, no qual quase todas, se não todas, as civilizações fracassariam, passando a um estágio civilizatório degenerado, rumo à extinção, abortando seu curso de evolução.
Na Oficina de Astronomia® 431, ministrada pelo nosso colega professor Roberto André dos Santos, que é biólogo, foi sugerido que civilizações seriam becos evolutivos, trajetórias sem saída. Esta ideia, combinada com a extrema raridade das civilizações tecnológicas (baixa taxa de aparecimento), poderia explicar porque a Via Lactea, apesar de todo o seu tempo de existência, ainda não foi colonizada de ponta à ponta.
Inteligências autoconscientes poderiam construir civilizações, impulsionadas pelas molas mestras da ganância e da agressividade, porém estes mesmos fatores seriam seus algozes quando do gargalo, fazendo com que não existissem civilizações maduras e sêniores.
Ora, o principal marco divisório entre uma civilização primitiva e uma civilização adolescente seria a descoberta e o domínio da teoria eletromagnética, enquanto um dos pré-requisitos fundamentais para uma civilização madura seria o domínio pleno do voo interestelar, condição sine qua nom para qualquer hipotético invasor alienígena. Então, não existiriam viajantes interestelares.
Porém, mesmo que os houvesse, embora, a rigor, não saibamos ao certo, parece razoável supor que civilizações maduras tenderiam a ser amigáveis e pacíficas. Um perfil agressivo-ganancioso não parece compatível com o conceito de uma sociedade inteligente tecnológica madura, ou sênior, pois aqueles comportamentos conspirariam contra as suas longevidades.
Então, mesmo no caso da existência de várias civilizações maduras expandindo-se por uma galáxia, o cenário de um contato invasivo-agressivo ainda desponta como de probabilidade remota. Esta improbabilidade ainda seria inversamente proporcional à quantidade de civilizações co-existentes pois, em um cenário pluralista fraco, a distância média entre uma civilização e outra seria da ordem de dezenas de milhares de anos-luz, reduzindo em muito as chances de um contato presencial direto.
Num contexto pluralista forte (um número elevado de civilizações co-existentes), as chances deste contato direto seriam maiores, em função da menor distância média inter-civilizações, mas o risco de uma invasão agressiva ainda poderia resultar pequeno, em virtude do provável caráter predominantemente benigno das culturas maduras e sêniores, à diferença do que nos é mostrado, por exemplo, no universo ficcional de Star Wars.
Na literatura astrobiológica é possível encontrar outros autores que também compartilham desta opinião [e.g., Sagan, Sagan e Drake, (1972), Science, 175, 881, e Shostak, S., (2013), International Journal of Astrobiology, 12, (1), 17].
É claro, não temos a mínima ideia de como seria a arquitetura mental de uma eventual inteligência alienígena. Esta certeza abre a brecha para o caso de poderem existir civilizações maduras ou sêniores muito evoluídas e agressivas. Por mais improvável que pudesse ser esta alternativa, o Universo é tão grande que ela poderia acontecer, com quase total certeza, em algum momento, em algum lugar, numa galáxia remota. Neste caso, se a sociedade invadida não for de nível evolutivo e tecnológico equiparável ou superior à cultura agressora, poderíamos não ter um final feliz, como em A Guerra dos Mundos, ou Independence Day.
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* Astrônomo, presidente do Conselho Curador da Rede Omega Centauri para o Aprimoramento da Educação Científica.