Crônicas

ETA AQUÁRIDAS 2022: CONDIÇÕES IDEAIS

Luiz Augusto L. da Silva*

            Neste ano a ausência da Lua nas madrugadas da primeira semana do mês de maio propiciará céus escuros ideais para o acompanhamento daquela que é, sem dúvida, a melhor chuva de meteoros de recorrência anual para observação ao sul da linha do equador.

            A Lua Nova acontece dia 30 de Abril às 17h28min (horário de Brasília), dando início à lunação número 1229, dentro da série iniciada em 1923. A edição 2022 do Anuário Astronômico Catarinense informa que o máximo de atividade das Eta Aquáridas ocorrerá durante a madrugada do dia 6. A International Meteor Organization (IMO) cita dia 6, às 05h. Fred Espenak, no site Astropixels.com, lista dia 5, às 05h. A Lua só entrará em Quarto Crescente dia 8 às 21h21min, assim o céu da segunda parte da noite estará completamente livre da interferência do luar durante o período de máximo de atividade da chuva.

O Que é

            Meteoro é um fenômeno luminoso de curta duração que resulta do ingresso e da ablação de uma pequena partícula de poeira (meteoroide) que ingressa em alta velocidade na atmosfera da Terra, proveniente do espaço interplanetário. Essas partículas meteoroidais são liberadas a partir de núcleos de cometas, quando  estes se aquecem nas proximidades do Sol, ou quando experimentam episódios repentinos de fragmentação. Meteoros típicos costumam durar de 1 a 2 segundos, e se iluminam na atmosfera terrestre superior (a cerca de 100 km de altitude).

            Sempre que a Terra intercepta a órbita de algum cometa, uma grande quantidade de meteoroides resulta atraída pela gravidade terrestre, penetrando na atmosfera e produzindo uma chuva de meteoros. Por efeito de perspectiva, meteoroides com órbitas mais ou menos paralelas no espaço parecem divergir a partir de um mesmo ponto do céu, que é denominado radiante.

Eta Aquáridas

            Os meteoros Eta Aquáridas descendem do núcleo do célebre cometa 1P/Halley, e são visíveis todos os anos durante o outono, principalmente no mês de maio, quando a Terra cruza a porção pós-periélica da órbita do cometa. Seis meses mais tarde, em outubro, nosso planeta atravessa a parte pré-periélica daquela órbita, produzindo outra chuva de meteoros, as Oriônidas. Hoffmeister (1913, Astr. Nachr., 196, 309) foi o primeiro a estabelecer a conexão das Eta Aquáridas com o cometa 1P/Halley, com base na similaridade dos elementos orbitais.

            Catalogada como 031 ETA na Lista de Trabalho de Chuvas de Meteoros Visuais da International Meteor Organization (IMO), o período de atividade desta chuva vai de 19 de Abril a 28 de Maio. Observações visuais coletadas a partir de 1984 mostram que as taxas horárias zenitais (THZ’s, ou ZHR’s em inglês) são sempre acima de 30 durante a semana que vai de 3 a 10 de Maio.

            Foi sugerido que a THZ máxima sofreria uma variação cíclica com período de 12 anos (possivelmente relacionada a perturbações gravitacionais induzidas pelo planeta Júpiter), mas um estudo recente combinando dados visuais e de radar [Egal et al., (2020), Astron. Astrophys., 640, id.A58, 24pp] não confirmou a correlação.

            Em 2017 foi observada uma THZ máxima de 75. Desde então, este número vem caindo para 60 (em 2018), 50 (em 2019 e 2020) e 45 (em 2021), sugerindo uma tendência de queda. A IMO costuma mencionar uma THZ máxima entre 40 e 85, que seria periodicamente variável, embora ressalte que mais observações são necessárias para estabelecer a questão.

            A THZ refere-se à quantidade horária de meteoros que seria observada num céu com magnitude limite +6.5, com o radiante situado no zênite (vertical do lugar). As quantidades efetivamente observadas de meteoros são quase sempre inferiores ao valor da THZ. No dia do máximo, se poderia esperar uma taxa efetiva de, talvez, ao redor de 30 meteoros por hora, o que fornece, em média, um meteoro a cada dois minutos.

            Os meteoros Eta Aquáridas são ligeiros, a maioria possui magnitudes entre +2.5 e +3.0, e cerca de 20% mostram cores, como branco-amarelo ou, mais raramente, laranja ou verde.

Máximo Triplo?

            Evidências observacionais sugerem que o máximo de atividade das Eta Aquáridas seja tríplice. Além do máximo principal, dia 6, parece haver dois máximos secundários em 8 e em 10 de Maio. Este último pôde ser detectado nas observações realizadas pelo autor e O. D. Dalávia em 11 de Maio de 1986 no interior do município de Guaíba, sul do Brasil.

A Posição do Radiante

            O radiante localiza-se na constelação de Aquarius (Aquário), próximo da estrela de terceira magnitude Eta Aquarii, daí o nome da chuva. Durante a primeira semana de maio, a sua posição coincide aproximadamente com um pequeno grupo de estrelas com forma de letra Y, apelidado de “Jarro de Água”. Ele é constituído pelas estrelas Gamma, Zeta, Eta e Pi Aquarii, nas coordenadas equatoriais α = 338o (ascenção reta) e δ = -01o (declinação). Mas esta posição muda lentamente de um dia para o outro, em virtude do movimento orbital da Terra em torno do Sol, que altera a geometria de interceptação dos meteoroides. Em outras palavras, o radiante migra para leste e para o norte no céu, numa razão de Δα = +0.69o/dia e Δδ = +0.6o/dia [Campbell-Brown e Brown (2015), Mon. Not. R. astr. Soc., 446, 3669]. A tabela 1 fornece a posição do radiante das Eta Aquáridas em datas selecionadas, distribuídas ao longo do período de atividade. A Figura 1 mostra uma plotagem da deriva do radiante sobre um mapa estelar. No fim de Maio, o radiante já invadiu a área da constelação de Pisces (Peixes).

Fig. 1 – A deriva do radiante da chuva de meteoros Eta Aquáridas em relação ao fundo fixo das estrelas (IMO).

Sobre o Período de Atividade

            Campbell-Brown e Brown (2015 – ref. cit.) encontraram que o período de atividade desta chuva meteórica compreende o intervalo  de 25 de Abril a 21de Maio, com atividade ainda detectável cerca de uma semana antes e depois daquelas datas num nível pouco acima do “ruído” normal de fundo.

A posição do radiante das Eta Aquáridas em diferentes datas ao longo do período de atividade da chuva. (IMO)

Em 21 e 22/MAI/1988, D. Morais e o autor, observando em Imbé, Brasil, encontraram o radiante ainda ativo. Pareceu-nos, na ocasião, que não haveria razão para que a atividade meteórica cessasse repentinamente, pelo que é provável, até mesmo, que alguns meteoros Eta Aquáridas tardios possam ser observados na transição do mês de Maio para Junho.

Como Observar

            Existem muitas maneiras de observar meteoros. A observação visual mais comum deve ser feita a olho-nu, pois os meteoros espalham-se por uma área grande do céu, impossível de cobrir com binóculos ou telescópios. Utilize uma cadeira reclinável de praia, e instale-se confortavelmente, providenciando proteção adequada contra o frio e a umidade noturna.

Fig. 2 – Simulação do campo estelar na direção leste-nordeste às 03h da manhã em 6 de Maio de 2022, para um observador em Porto Alegre, assinalando a posição do radiante da chuva meteórica Eta Aquáridas. À direita, nada menos de 4 planetas brilhantes podem ser discernidos! Crédito da imagem: L. A. L. da Silva/Núcleo de Astromídia/Rede Omega Centauri.

            No caso das Eta Aquáridas, deve-se olhar para a direção nordeste a partir das 3 horas da madrugada até os primeiros sinais da aurora, com o centro do campo de visão mais ou menos a 45 graus de altura sobre a linha do horizonte. É preciso lembrar, ainda, que os meteoros podem aparecer fora da região compreendida pela constelação de Aquarius. Quando isso acontece, normalmente suas trajetórias são mais longas, pois estamos vendo o meteoro “de lado”. Quanto mais próximo do radiante, mais curta será a trajetória meteórica no céu, pois eles estarão aparecendo quase que “de frente” em relação ao observador. Raramente um meteoro surge na exata posição do radiante. Neste caso, chama-se um “meteoro frontal”, que não mostra deslocamento aparente no céu, limitando-se a acender-se e apagar-se dentro de apenas um instante.

            O local de observação deve necessariamente situar-se longe da poluição luminosa das cidades, de preferência numa área rural, e ser desprovido de obstruções artificiais ou naturais que possam restringir a visibilidade.

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*Luiz Augusto L. da Silva é astrônomo, e desde 1973 gosta de observar meteoros.

(www.luizaugustoldasilva.com)

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