Crônicas

O PARADOXO DE OLBERS, E O “PARADOXO” DE FERMI

Luiz Augusto L. da Silva*

            Em 1826, o astrônomo alemão Heinrich Wilhelm Matthäus Olbers (1758 – 1840) deu-se conta de que o fato trivial das noites serem escuras implicava na finitude do Universo, tanto no espaço quanto no tempo. Ou seja, o tamanho do Universo era limitado, e ele não tinha existido sempre, isto é,  tinha havido um começo para tudo. Caso o cosmos fosse infinito em número de estrelas e/ou na idade, sua densidade de energia seria infinita, e não existiriam noites! Mais: já teríamos sido cozidos há muito tempo…

            De uma maneira mais ou menos análoga, o fato banal de sairmos para jantar sábado à noite e não enxergarmos nenhum ET sentado na mesa ao lado da nossa mostra que os extraterrestres – enquanto seres inteligentes, autoconscientes, e construtores de civilizações tecnológicas avançadas – não existem!

            O físico norte-americano de origem italiana Enrico Fermi (1901 – 1954) já tinha percebido esta questão em 1950, quando perguntou a seus colegas em Los Alamos durante um almoço: “Onde estão eles?!”. A pergunta ficou conhecida como o “paradoxo” de Fermi. Usamos paradoxo entre aspas porque não se trata de um paradoxo, no sentido autêntico da palavra. Melhor seria usar “pergunta”, ou “alegação” de Fermi.

Simplicidade Desconcertante

            Simples do jeito que é, a pergunta de Fermi dá o que pensar. E é assim porque um raciocínio elementar mostra que toda a nossa Galáxia, a Via Lactea, poderia, em tese, ser colonizada em pouco mais de um milhão de anos, mesmo por uma civilização que não empregasse velocidades relativísticas na sua estratégia de expansão. Um milhão de anos representa apenas 1% da idade astrobiologicamente útil da Galáxia, que é de 10 bilhões de anos. Houve tempo demais para uma colonização efetiva. E parece que ela não ocorreu.

            Uma das contestações mais frequentes desta ideia consiste em questionar o “espírito imperialista” dos supostos ET’s. Alega-se que seres extraterrestres muito avançados poderiam não estar interessados em se expandir muito além de sua estrela natal, nunca cogitando criar um Império Galáctico. Mas esta explicação só pode funcionar dentro de um cenário singularista,  onde a Via Lactea seja escassamente povoada por pouquíssimas civilizações, todas elas com curtas expectativas de vida. O argumento não pode ser usado numa perspectiva pluralista, ou seja, numa Galáxia superpovoada de sociedades tecnológicas, porque fica muito difícil admitir que entre tantas civilizações, nenhuma quisesse colonizar a Galáxia, durante todo o longo período de tempo de 10 giga-anos.

            O mesmo raciocínio aplica-se à hipótese de que estamos sendo observados, mantidos dentro de um cordão de isolamento deliberado a fim de não haver interferência na nossa evolução, uma ideia conhecida como “hipótese do zoológico”, proposta em 1973 na revista Icarus [19, (3), 347] pelo radio-astrofísico norte-americano John A. Ball (1935-2019), numa espécie de versão cósmica da plaquinha “Não Alimente os Animais”.

            Tal cordão de isolamento seria muito improvável de ser estabelecido, dentro de um cenário singularista. No caso pluralista, alguém, cedo ou tarde, acabaria jogando pipocas aos macacos. E já houve muito tempo para isto acontecer…

            Nas Oficinas de Astronomia® 442 e 454, disponíveis no canal Rede Omega Centauri no Youtube, oferecemos evidências de que a taxa de formação de civilizações tecnológicas numa galáxia espiral típica como a Via Lactea possa ser da ordem de apenas 1 civilização por giga-ano, e que a duração máxima de cada uma delas não excederia cem milhões de anos, apenas 10% de um giga-ano. Considerando que civilizações tecnológicas são sistemas naturalmente instáveis, que se tornam crescentemente mais frágeis à medida que a sua complexidade aumenta, e, se a probabilidade de sobrevivência destas civilizações é de apenas 10% ou mesmo menor, então é possível concluir que o tempo médio para uma colonização total seria da ordem da idade da Galáxia. Se a probabilidade média de sobrevivência for de apenas 1%, este tempo seria da ordem de dez vezes a idade atual do Universo! Sendo assim, a constatação de Fermi não esboça nenhum resultado ou fato surpreendente, dissolvendo-se de forma bastante natural.


* Luiz Augusto L. da Silva é astrônomo, e desde 1973 também se pergunta “onde estão eles?!”.

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